“Há um longo caminho a percorrer pela igualdade” – Luísa Nemésio, vice-presidente da AMI, sobre o Dia Internacional da Mulher

Mais de 50% dos beneficiários da AMI que recorrem a apoios sociais ao nível do acompanhamento social, da alimentação, aquisição de material escolar, roupa ou medicamentos, são mulheres. Nos pedidos de apoios sociais feitos pelas mulheres está a salvaguarda das suas famílias. Elas ainda são as principais provedoras do bem-estar, com grande carga de responsabilidade no trabalho e em casa. 

Luisa Nemésio passou por trinta países com a desenvoltura e espírito de iniciativa que herdou de uma família onde “não há restrições de género, homens e mulheres sempre tiveram as mesmas tarefas e oportunidades”.   Desempenha um dos 62 lugares de chefia na AMI, dos quais 77% são ocupados por mulheres. Mas, na sua passagem pelo Níger, Guiné-Bissau, Angola e Índia conheceu mulheres a quem a igualdade está vedada. A afirmação como força principal da sociedade é feita a partir dos seus “espíritos determinados e empreendedores, enquanto provedoras das suas famílias”. 

Em Portugal, a vice-presidente da AMI, reconhece que “apesar dos cenários completamente diferentes”, as mulheres também são quem tem o trabalho mais precário, os salários mais baixos e menos acesso à educação e são quem assume o papel provedor da família, com pesadas responsabilidades em casa”, o que dá a Portugal “um longo caminho a percorrer pela igualdade de direitos”. 

Mais de 50% dos beneficiários da AMI que recorrem a apoios sociais ao nível da alimentação, aquisição de material escolar, roupa ou medicamentos, são mulheres. “No pedido de apoio social de uma mulher está a salvaguarda para uma família”, afirma. 

Sobre o que deveria ser feito para promover a igualdade, Luisa Nemésio aponta “um maior questionamento e educação sobre este papel cuidador ainda assumido de maneira geral pela mulher e que tem de ser mais partilhado. Em casa, na escola, no trabalho, não é apenas uma questão de quotas, é uma questão de afirmação e atitude”. 

Mais do que as missões, os rostos 

Na sua viagem à volta do mundo tendo as missões da AMI como destino, “as pessoas e os seus rostos” são o que a marca sempre. 

Da Sérvia à Índia, Luisa Nemésio recorda tempos e lugares, onde ser mulher foi um ato de coragem. “As guerras por si só são violadoras dos direitos humanos. E os mais vulneráveis são invariavelmente, crianças, mulheres e idosos”. Nas cidades, vilas e aldeias dos países em guerra, mulheres e crianças tinham rostos endurecidos por combates que nem sempre são visíveis. “A única coisa que denunciava o conflito nos bastidores, eram os escombros de igrejas, as casas protegidas por sacos de areia…”. 

Na Guiné-Bissau e em Angola “onde para lá das cidades nada chega e as pessoas nada têm”. 

De Angola, onde se recorda de uma missão de nutrição pouco depois de terminada a Guerra Civil, admite que “trouxe lágrimas”. Levava doze horas para percorrer uma distância de 300 quilómetros, “ao longo de uma estrada onde não havia pontos de fornecimento de água nem um posto de abastecimento de combustível, isto num país que faz exploração petrolífera”. Nas aldeias “tudo era precário, sem água, luz, acesso a cuidados de saúde e saneamento”. 

África deu-lhe ainda a memória de uma aldeia escrava do Níger, “onde as pessoas têm um olhar de dignidade e ao mesmo tempo de questionamento, sobre o que uma ONG está ali a fazer e o que quer mudar no seu modo de vida secular e organizado”. Nos gestos diários das mulheres ressalta a marca da “determinação em prover às famílias tudo o que necessitam”. 

Luisa Nemésio chegou à AMI como voluntária em 1985, ano definido pela ONU como Ano Mundial da Juventude, tempo marcado pelo grande sismo do México, pela intensificação da Guerra Fria na Europa e conflitos desde a Guiné-Bissau ao Iraque. Assume que na época, fez uma escolha arriscada, apostando numa organização ainda a dar os primeiros passos. Mas, a ativista sempre teve como ideal ajudar os outros com o seu trabalho, por isso, quando viu o anúncio de recrutamento da AMI para voluntários, não hesitou em responder. 

Começou pelo trabalho voluntário como administrativa até ser contratada como profissional efetiva e seguir viagem a bordo da primeira missão humanitária internacional da AMI, na Guiné-Bissau. “O plano para levar àquele país ajuda foi inicialmente financiado do bolso de Fernando Nobre, da sua irmã e meu”. Para a missão avançar, cada um avançou com o financiamento das passagens aéreas dos voluntários, até a Comissão Europeia, que já tinha aprovado o projeto, enviar os fundos requeridos pela organização. 

Foram os primeiros a chegar a Lugadjole, na região do Boé, fazendo prevalecer o lema “a AMI vai onde ninguém quer ir”, pois desde o fim da guerra colonial nenhuma organização tinha entrado num lugar conhecido pelo domínio das guerrilhas e onde aliás tinha sido auto-proclamada a Independência em Madina do Boé. 


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